domingo, 30 de novembro de 2008

Nelson Rodrigues recria a fala e a realidade carioca.


Nelson Rodrigues foi um autor muito original, que teve uma vida muito difícil desde o começo. Com 13 anos, ele começa a carreira de repórter policial ,com 17 anos presenciou o assassinato do seu irmâo Roberto Rodrigues.


Isso pode justificar a intensa dramaticidade de suas tragédias, que foram transfiguradas para o universo popular do Rio de Janeiro e desse modo, revolucionou o teatro brasileiro.

Essa abordagem, no entanto, não teria a abrangência que conseguiu se ele não tivesse inspiração na oralidade das ruas para construir seus diálogos cheios de gírias e alguns palavrões – uma forma de expressar que feriu tanto os moralistas e lhe rendeu insultos públicos de pornógrafo.

Nelson tinha consciência de que pretendia trazer inovações ao teatro ao trocar a linguagem rebuscada da representação pela forma de falar viva do dia-a-dia?
Muito comum nos trabalhos do autor são os sinais trocados, como o lar, que deveria ser um lugar de paz e tranquilidade, vir a ser cheio de tensão e ódio, enquanto o bordel tem característica de um lugar confortante.

Nelson Rodrigues também idealizava os personagens para depois rebaixa-las: a tensão entre anjo e animal é constante. Mesmo disfarçando, todo mundo tem o animal dentro de si.

Nelson trabalhava acima dessa tensão, entre ideal e rebaixamento dos elementos naturalistas. Então um contraste entre melodrama (idealização das personagens) e Naturalismo. Outra característica do autor são os "Golpes de teatro", ou seja quando, no final da peça, acontece uma coisa muito inesperada.

Em suas obras surgem "Situações moralmente insustentáveis", onde a comédia é enervada pelo drama, ou o drama se desmoraliza pela comédia. O teatro dele bateu na sociedade. A incoerência o choque são mais características do melodrama que definem um gênio da dramaturgia brasileira que recriava com brilhantismo a realidade de uma sociedade doente.

Embora a sua obra ainda gere um certo mal estar entre os espectadores, por isso, ele será sempre contemporâneo, enquanto vivermos a realidade da alma humana, tão agredida com as suas verdade verdadeiramente cruéis. Um gênio que recrio estética e teatralmente a realidade carioca de uma forma verbal ímpar, um artista ainda contemporâneo que de uma forma extremamente clara soube usar a oralidade para colocar o simbolismo em pauta em todas as suas obras criando um universo único cheio de ódio, graça e principalmente criatividade

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Crítica - Espetáculo : A forma das coisas

Embora todos saibamos que ninguém muda ninguém, ao menos em sua essência, resta a possibilidade de se alterar a aparência. E é o que Evelyn faz com Adam: pouco a pouco, a estudante de artes transforma o guarda do museu da faculdade, com quem inicia um namoro, em outra pessoa, supostamente melhor e mais atraente. E tal transformação acaba gerando conseqüências em Johnny e Diana, amigos de Adam. Mas estaria Evelyn sendo movida apenas pelo salutar desejo de ajudar alguém ou algo completamente inesperado estaria por trás de suas ações?
Lamentavelmente, tal pergunta não pode ser aqui respondida, pois isso privaria a platéia de uma surpresa desconcertante. Seja como for, no parágrafo acima está resumido, ao menos em sua aparência, o enredo de "A forma das coisas", do norte-americano Neil Labute. Em cartaz no Espaço Sesc, a montagem chega à cena com direção de Guilherme Leme e elenco formado por Pedro Osório, Carol Portes, André Cursino e Karla Dalvi.
O que nos parece mais extraordinário no presente texto é a compreensão que temos do mesmo em função de seu desfecho. Não fora ele, tudo se resumiria a uma história corriqueira, ainda que estruturada de forma interessante e habitada por personagens bem construídos. Mas seu final nos obriga a empreender uma série de reflexões, da maior pertinência, sobre o mundo em que vivemos.
Com relação ao espetáculo, Guilherme Leme impõe à cena uma dinâmica ágil, criativa e sofisticada, precisa no tocante ao ritmo e capaz de valorizar todos os conteúdos propostos pelo autor. Além disso, Leme consegue extrair ótimas atuações do elenco. Na pele de Evelyn, Carol Portes exibe carisma, forte presença cênica e notável capacidade de explorar todas as facetas de sua complexa personagem. A mesma e brilhante eficiência se faz presente na atuação de Pedro Osório, que expõe com precisão cirúrgica a "evolução" de seu personagem. Karla Dalvi também convence plenamente como a jovem ingênua, reprimida e submissa, com André Cursino conseguindo extrair o máximo de um papel mais limitado do que os demais.
Na equipe técnica, o grande destaque vai para a cenografia de Aurora Campos, composta de quatro pilastras brancas que, no decorrer da montagem, vão formando múltiplos ambientes, transformando a cena à medida que os personagens se transformam. Mas são também de altíssimo nível a luz de Maneco Quinderé, a tradução de Marcos Ribas de Faria, os figurinos de Sonia Soares e Tatiana Brescia, a trilha sonora de Marcelo H. e a preparação corporal de Marcos Damico, fundamentais para o êxito deste espetáculo simplesmente imperdível.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Crítica - Espetáculo Cachorro

Dramaturgia é tudo.

No inicio me parecia mais um melodrama onde o triângulo amoroso uns dos grandes clichês das artes cênicas seria abordado. 
Porém, a referencia ao universo rodriguiano foi assumida , nosso maior dramaturgo e profundo conhecedor da alma humana, com todas as suas grandezas e abjeções.  Jô Bilac,o autor é objetivo e não esconde suas inspirações o que nos faz pensar no obvio, "Cachorro!" no Teatro Maria Clara Machado, com direção de Vinicius Arneiro e no elenco  Felipe Abib, Carolina Pismel e Paulo Verlings.
Tudo fica em torno de um casal cuja esposa trai o marido com o melhor amigo dele. E o enredo também é preivisível: os amantes oscilam entre assumir a relação, contando a verdade ao traido esposo, ou simplesmente fugirem juntos. Mas também chegam a considerar a hipótese de se suicidarem, bem ao estilo rodriguiano.
gostaría de ressaltar a excelente qualidade do texto, os ótimos diálogos e personagens muito bem construídos. E sobretudo a capacidade de Jô Bilac de prestar um tributo a Nelson Rodrigues sem tentar, em nenhum momento, copiar seu estilo. Nelson é uma clara referência, evidentemente, mas o jovem autor consegue imprimir sua marca, mesclando com grande habilidade momentos trágicos e hilariantes. Sem dúvida, Jô Bilac é uma grande revelação, ao menos para nós, que não conhecíamos nenhuma outra peça de sua autoria.
Quanto ao espetáculo, Vinicius Arneiro impõe à cena uma dinâmica em total sintonia com o texto. O diretor cria marcas inventivas e imprevistas, e não raro impregnadas de gestos e movimentos coreográficos, sendo tudo executado com extrema precisão pelo jovem elenco. Felip Abib, Carolina Pismel e Paulo Verlings exibem muitas qualidades, tanto vocais como corporais. Além disso, entregam-se com alegria e extrema disciplina ao jogo cênico proposto pelo encenador, e certamente a soma dessas virtudes contribui decisivamente para a empatia que estabelecem com os espectadores.
Na equipe técnica, Paulo César Medeiros assina uma luz expressiva, decisiva para enfatizar os múltiplos climas emocionais em jogo. Também destacamos o ótimo cenário de Daniele Geammal, composto basicamente de luminárias e praticáveis transparentes constantemente manipulados pelos atores. Júlia Marini responde por corretos figurinos, a mesma correção presente na trilha sonora de Diogo Ahmed.
O espetáculo digno da nova safra de artístas teatrais , muita qualidade e expressividade em todas as premissas do teatro, o que me faz pensar que depois da ditadura restou algum artísta, o que todos os dias vejo pessoas pregando que depois disso só  as sobras ou a tentativa de uma arte ineficiente.